sábado, 4 de junho de 2016

Ser forte para ser delicado





A delicadeza, sem força, é um carinho sem tônus, que não confronta.

A força, sem delicadeza, é um tônus reativo, que não cuida.

A força delicada é um tônus que acolhe.

A delicadeza forte é um carinho que protege.

Quem são os homens que, hoje, arriscam ser delicados, sem abrir mão da sua força?

Quem são os homens que, hoje, sustentam ser fortes, revestindo-se de delicadeza?

Conseguir massagear a dor do mundo com mãos que não se acovardam, nem a apertam até sufocar.

Conseguir massagear a própria dor com mãos que entram firmes e sensíveis no próprio coração.

Respirar o ódio que atravessa as estranhas, para que ele esquente o sangue da compaixão, em vez de estourar as veias da sensibilidade.

Insuflar no corpo macio a vitalidade que nos motiva a seguir em frente e fazer o que precisa ser feito, sem preguiça ou lentidão.

Ter o vigor para manter-se imóvel diante do chacoalhão do vento, e doce para recebe-lo como um presente de Deus.

Curar o que nos aflige com uma mão que corta e outra que afaga.

Ter firmeza para ouvir o grito sem desabar, e empatia para entrar em ressonância com a voz que nos atravessa.

Mover-se com os músculos de um guerreiro e as articulações de um dançarino.

Trazer na voz o tom grave que desce até o centro da terra e o timbre agudo que sobe até os céus.

Ter delicadeza para sorrir e força para nada expressar se não “eu estou aqui”.

Ter força para cuidar de todos e delicadeza para cuidar de si.

Ser delicado para abrir as portas de casa e força para sustentar a solidão.

Ser forte para sustentar os ideais e delicado para ampliá-los com a escuta dos demais.

Legitimar a própria existência por reconhecer a poesia delicada da vida em cada segundo de ser quem se é, e ter força para sustentar o seu valor tanto no palco da aprovação alheia, quanto quando estamos sozinhos, olhando apenas para o espelho de nossa alma.

Ser feliz, arrebatado por toda a delicadeza e força de viver.


segunda-feira, 16 de novembro de 2015




Escuta os gritos

de Paris.

Os gritos de quem agoniza

no chão.

Escuta os tiros

como gritos

de quem atira

- e os escuta também.

Escuta o grito

aterrorizado

de um mundo

que anseia por se sentir

seguro.

Escuta os gritos

do outro mundo,

que comemora

o sangue,

e que grita por algo

também.

Escuta os gritos

que não se

ouvem,

das vítimas e algozes

em lugares que não se vê.

Sem a mídia

como megafone,

eles gritam baixo

- mas, ainda assim,

gritam também.

Escuta os gritos

Marianos,

Diamantinos,

de rios, peixes e pessoas,

e tantos outros seres.

Gritos que ficam

invisíveis

quando só escutamos

os gritos de Paris.

Mas escuta os gritos

de Paris também,

Pois escuta não se

escolhe

- só se amplia -

quando escolhemos

não "o nosso",

e sim

"o bem".

Escuta o grito de

raiva,

medo,

preguiça,

sonhos,

que vem de

Dentro.

Pois é ele quem

ressoa

com o grito de

alguém.

Escuta e acolhe

esse grito profundo,

que lá fora,

transformado,

ele grita

a compaixão

que não se cala,

não se curva,

nem se vinga,

mas grita,

com coragem

o silêncio pacífico

que abençoa

o mundo.

domingo, 18 de outubro de 2015

Celebrando o meu maior presente de aniversário!



Daqui a pouco, em 27 de outubro, eu completo 34 anos. Um aniversário especial, pois comemora duas grandes viradas de vida. Uma aconteceu neste ano: minha mudança com minha esposa, Rafaela, para Santo Antônio do Pinhal - ainda que continuemos a passar em média 3 dias por semana em São Paulo. A outra aconteceu há exatamente 10 anos, quando, próximo do meu aniversário de 24 anos, fui iniciado em meditação por um monge de Ananda Marga (Caminho da Bem-Aventurança), uma linha do Tantra Yoga que não foca no sexo como prática espiritual, e sim na expansão da consciência por meio do amor devocional, da investigação interna e do serviço ao mundo.

Seu nome de monge era Dada Diipajinanananda, um neozelandês alto, de olhos profundos, e muito silencioso. Quando ele deixou o Brasil, eu havia recebido a primeira e a segunda lições de meditação (são seis). Depois, recebi a terceira da monja americana Didi Anandamitra, que muitos conhecem no Brasil como Susan Andrews, fundadora e diretora do Instituto Visão Futuro. Em seguida, pedi ao monje Dada Jinanananda, um dinâmico monge do Congo que inspira muitos jovens aqui no Brasil a se engajar tanto na prática espiritual quanto na luta por transformação social, para que fosse meu orientador de meditação, e ele me deu as três lições finais.

Por isso, em primeiro lugar, quero honrar esses três orientadores, que me deram de presente a joia preciosa das lições de meditação, que pratico quase que invariavelmente duas vezes ao dia. Dessas sentadas, às vezes indescritivelmente deliciosas, às vezes assustadoramente desafiadoras, eu retirei muito mais do que poderia imaginar. Não apenas os benefícios normalmente associados à meditação, como concentração, foco e relaxamento, mas também estabilidade e aprofundamento emocional, clareza de quem sou e do meu propósito nesta vida, insights profundos e transformadores sobre meu passado e meus traumas, e também sobre o que oferecer para o mundo como serviço – e como, quando e onde.

A meditação me empoderou no meu processo de auto-cura e, acima de tudo, abriu a porta para um conjunto de experiências que eu jamais havia tido com qualquer outra experiência humana (mesmo em práticas espirituais). É difícil descrever essas experiências, mas elas quase tornam a palavra Amor como uma palavra pequena, que mal contém o que por dentro se está sentindo. Elas revelam uma busca que transcende o tempo e o espaço, e mesmo a noção de Eu. Elas tornam real a percepção de que a grande meta da minha existência eterna não é senão ser Um com Tudo que Existe, na forma do mais sublime Amor (vou usar a palavra por ser, ainda assim, a que mais se aproxima), e agradecer esse Amor vivendo todas as tonalidades da vida, das minhas luminosas às mais sombrias, como ofertas que coloco no altar do Amado. E esse Amado é o próprio Amor em suas três formas: a que está além da compreensão; a que se manifesta na criação que somos e que nos rodeia; e a que encarna na forma de uma entidade que possamos amar (o Deus, o mestre, o guru etc).

Portanto, quero, também, agradecer a esse Amor, que teve a generosidade de me abrir esse conjunto de experiências, pois sem que isso me tivesse sido permitido, minhas seis lições não teriam valido de nada. Esse Amor já havia se apresentado como um grande mistério que eu perseguia, para em seguida aparecer na forma de meu Guru de meditação, Anandamurtii, e agora se revela, cada vez mais, como toda a vida do planeta Terra, e de todo o Universo, com tudo de mais lindo e medonho que existe neles.

Agradeço, em especial, a Anandamurtii, meu Baba (Amado), pois todos os mestres que se colocam como pontos de concentração para onde podemos direcionar nosso Amor Devocional o fazem por profundo serviço amoroso ao outro, e não, como comumente pensamos no Ocidente, por desejo de serem adorados e servidos. O mestre se coloca como uma tela de projeção de todos os nossos padrões de relação conscientes e inconscientes com nossos pais e nossas autoridades internalizadas para que, pouco a pouco, possamos ir limpando essas projeções e, no final, mergulhar não na personalidade do mestre, mas no Amor Transcendental que se esconde atrás Dele.

A unidade com o mestre só acontece quando justamente alcançamos um grau de inclusão interna de tudo que existe, chegando ao entendimento de que não há nada do que se defender, ou para atacar. Tudo o que o mestre poderia nos trazer, de bom ou ruim, já existe integrado dentro de nós e, portanto, toda a tentativa de sustentar a fronteira do dentro e do fora, do eu e do outro, dissolve-se, não por perda de si, mas por expansão de si. Esse é um dos motivos pelos quais muitos mestres espirituais podem ser contraditórios e polêmicos com seus discípulos: quando são mestres verdadeiros, fazem isso para que que o discípulo experimente e transcenda todo o espectro da dualidade, desde a ponta mais luminosa à mais sombria. Para que o discípulo não se ligue ao mestre por atração ou por aversão, mas por reconhecimento da Unidade. Uma vez alcançado esse estado, não há mais fora – tudo está dentro. O mestre não é um líder autoritário que nos comanda arbitrariamente, mas antes um líder servidor que se destitui do desejo de ser querido pelos outros para se tornar um alvo de concentração no qual podemos gastar toda a nossa munição de projeções do ego, até não restar mais nenhuma história a ser contada sobre aquele alvo, e a experiência da Unidade se revele. E, a partir dela, podemos expandir essa experiência para tudo e todos.

Somente seres com total desapego de seus próprios egos poderiam coloca-los a serviço de tão grandiosa e árdua tarefa. De serem amados, odiados, duvidados, seguidos cegamente, temidos, desejados, até que todos esses fantasmas sejam destilados e reste apenas o reconhecimento do Inominável que, uma vez visto no mestre, é visto em si e em tudo mais. Tudo passa a ser apenas um instrumento para a refulgência do mais eterno e brilhante Amor.

Não posso afirmar que, nesses dez anos, todas as minhas defesas caíram, mas posso dizer que as que caíram já foram suficientes para que eu experimentasse um nível de paz e de conforto com a vida tão deslumbrantes, que eu não trocaria por qualquer outra experiência no mundo. Mas foram dez anos exatamente assim: amando, odiando, duvidando, seguindo cegamente, temendo e desejando. De briga e paz. Não com meu mestre, ou com o Amor, mas comigo mesmo. E eu sempre achava que era com Ele, mas no fim, via que era tudo projeção minha, e que Ele sempre esteve ali, amorosamente me olhando e esperando eu me encontrar. Logo, muito, muito grato, Baba, por sempre ter estado a meu lado. Só você (e eu) sabemos a jornada épica que foram esses anos, dentro e fora de mim, e de tudo que você fez por mim, para que eu crescesse e amasse tanto - a mim e à vida.

Por fim, quero agradecer a todos os que me apoiaram nesse caminho. Todos os mestres que me acolheram com carinho, em especial Jesus Cristo, que me recebeu nesse mundo e que se revelou por meio de pessoas tão especialmente iluminadas, como minha avó Ceiça, mãe de minha mãe, que me ensinou uma espiritualidade que ama, e não que castiga. Sei que minha saída do catolicismo pode parecer uma ruptura com minha história e minha tradição, mas não é. Todos os mestres são um só, e isso a mente consegue compreender. Mas o coração precisa amar alguém, como forma de aprofundar a relação (por isso escolhemos alguém para casar, por exemplo), e essa escolha vai além da lógica que conseguimos alcançar – só podemos entender com a intuição o que nos faz escolher um mestre, e não outro, como nosso objeto de devoção. Meu coração escolheu Anandamurtii, mas Jesus Cristo, e todos os que são, para mim, instrumentos verdadeiros de seu amor, como minha avó e minha tia Célia, terão sempre minha profunda gratidão.

Agradeço minha mãe, Maria Teresa, um ser liberto e que me ensinou a liberdade. Se não fosse ela, eu não teria jamais me permitido trilhar o meu caminho espiritual, e teria seguido num caminho que poderia ser bonito, mas não meu. Ela foi e continua sendo o testemunho de servir ao Amor Maior em qualquer forma com que ele se expresse, sem preconceitos, mas com muita seriedade e, graças a Deus, bom humor.

Agradeço a todos os amigos e irmãos espirituais, com quem compartilhei inúmeros momentos lindíssimos de prática, em que criamos juntos um campo de elevação, em que nos sentimos juntos tocando os pés do divino, enquanto cantávamos, meditávamos, contemplávamos a natureza, compartilhávamos histórias espirituais, conversávamos sobre o que realmente importa ou simplesmente compartilhávamos da doce presença um do outro. Nesse sentido, agradeço especialmente a minha esposa, amante e parceira espiritual, Rafaela, e a meus queridos companheiros da Comunidade Ser. Vocês são meus parceiros numa jornada numa antes trilhada – a de viver a senda espiritual de autoconhecimento e serviço ao mundo de forma coletiva, e materializando-a em projetos transformadores que fazem crescer a nós e aos outros.

E agradeço a todos os outros monges e orientadores, de Ananda Marga e de outros caminhos, que sempre me presentearam com joias de sabedoria e de inspiração, a ponto de eu me sentir o homem mais sortudo desse mundo, como um peregrino da alma que, a cada passo, encontra um sábio diferente que lhe abre mais uma porta. Um agradecimento especial a Susan Andrews, pelo conhecimento que me passou do Tantra e da Biopsicologia, e a Peter Sage, ou Dada Vishvarupananda, por ter sido sempre com um pai amoroso e acolhedor, humilde o suficiente para me ensinar tudo que sabe enquanto aparenta apenas estar aprendendo comigo, e por ser, acima de tudo, uma manifestação do que mais admiro no caminho da Ananda Marga.

Agradeço a tudo e a todos que fizeram desses dez anos uma década mágica de despertar e aprendizado, e rezo para que possa chegar ao final dos próximos dez anos com a mesma humildade e persistência de um praticante muito especial de Ananda Marga que conheci: Vishvashanti, um americano que mora na Dinamarca. Ele me disse num retiro que após vinte anos meditando sentiu que, agora sim, estava aprendendo a meditar! E espero que esse testemunho possa inspirar quem estiver sentindo o desejo de mergulhar nessa épica jornada para que o faça o quanto antes – da sua forma, em seu próprio caminho - pois, acredite, vale a pena. Que o caminho escolhido seja o do coração, e que a potência mais profunda e misteriosa da vida se revele a nós, e nos guie. Namaskar!



sábado, 12 de setembro de 2015



E como é 

Bom

Mergulhar

No que é

Quente,

Desmaiar

No que é

Fogo,

E acordar,

Novo.






Saudades daquele

Cardápio:

Ansiedade,

Sociedade,

Saciedade.






Para penetrar

Às vezes bastam

Olhos






A cada haicai

Uma parte da tua roupa

Cai