sexta-feira, 26 de setembro de 2014
(XXI)
Era tarde. Estávamos cansados. A dor no coração dela
transbordava pelos olhos. Não era nada grave. Estava apenas triste, de TPM, de
mau-humor. Frustrada porque não havia conseguido dar conta de tudo que havia
planejado no dia. E mesmo assim, ela era puro amor. Sentia a sua dor no meu
coração, que pulsava com doçura pela simples existência dela em minha vida.
Pedi licença para tomá-la em meus braços. Estendi a minha
mão, sobre a qual ela posou a sua. Puxando-a suavemente pela mão, convidei-a a
se levantar. Ela se ergueu, metade elegante, como sempre é, metade desabando,
como às vezes fica.
Cabisbaixa, com a força de seu corpo cedendo ao sono,
abraçou-me. Pousou sua face direita sobre meu ombro e afundou seu rosto em meu
pescoço. Seus braços continuavam delicados, mesmo se apertavam meu peito com um
misto de amor e angústia.
Esticando a mão, apertei um botão e a música começou a
tocar. Enquanto as notas se desdobravam e alcançavam nossos ouvidos, algo no
tempo parava. Pouco a pouco. Seu peso afundava mais e mais em meu peito, e seu
abraço me dissolvia numa melancolia, gentil e silenciosa.
Num suspiro, chorou. E o que habita em mim se aqueceu. De
gratidão, compaixão, beleza, alívio, inspiração, surpresa, força, encontro. Nos
pequenos passos lentos que dávamos, para um lado e para o outro, éramos um
vasto minúsculo eterno ninho de cura, e ela a sacerdotisa, que em sacrifício se
doava para fazer a dor do amor se transformar no prazer do amor outra vez.
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